No fundo do poço tem subsolo
Por: Jairo de Paula
Há quem diga que o fundo do poço é o limite.
O ponto final.
O lugar onde tudo se esgota.
Mas, na clínica psicanalítica — e na vida — eu aprendi que não é bem assim.
O fundo do poço não é o fim.
No fundo do poço tem subsolo.
E esse subsolo, apesar de escuro, é fértil.
É o lugar onde ninguém quer estar, mas onde, paradoxalmente, tantas reinvenções começam.
O subsolo como pausa necessária
Quando a vida despenca e nos arremessa para baixo, o primeiro impulso é tentar subir desesperadamente.
Mas subir sem forças, sem estratégia e sem consciência apenas prolonga a queda.
O subsolo, metaforicamente, é o espaço onde o sujeito pode — pela primeira vez em muito tempo — parar.
Nesse lugar silencioso, onde não há mais o que perder, começa-se a ganhar algo essencial: a possibilidade de se ouvir.
O subsolo permite um intervalo, uma suspensão do ruído, das exigências, das máscaras.
É a pausa que ninguém ensina, mas que o sofrimento força.
A psicanálise e a travessia pelo subterrâneo
Freud nos mostrou que aquilo que dói também revela.
E, na escuridão, certos conteúdos emergem com clareza inesperada.
No subsolo, o sujeito:
- confronta sua própria verdade,
- revisita feridas antigas,
- identifica padrões repetidos,
- reconhece desejos esquecidos,
- e escuta aquilo que, na superfície, estava abafado.
Não se trata de romantizar a dor — nunca.
Mas de compreender que existe potência onde antes havia apenas queda.
Criar estratégia é mais importante que escalar
O problema de quem tenta sair do fundo do poço com pressa é que sobe de qualquer jeito — e cai de novo.
O subsolo convida à construção de uma saída que seja sustentável, segura e coerente com a própria história.
Afinal:
- subir exige força,
- força exige preparo,
- preparo exige pausa.
É no subsolo que se reorganiza o movimento interno que permitirá a subida.
Ali, o sujeito fortalece aquilo que, na superfície, estava frágil demais para se sustentar.
O fundo do poço como possibilidade
A verdade é que ninguém desce até lá por vontade própria.
Mas, uma vez lá, descobre-se algo surpreendente:
não é um fim — é um começo possível.
No fundo do poço, há o encontro consigo mesmo.
E no subsolo, há o reencontro com a própria possibilidade de escolha.
Sair de lá deixa de ser uma corrida e vira um retorno.
Um retorno mais lúcido, mais inteiro, mais digno.
O convite final
Se você está no fundo do poço, reconheça sua dor.
Mas reconheça também que há mais: há um subsolo, um território de pausa, de reconstrução e de reorientação.
Não se trata de ficar ali, mas de usar esse espaço como ponto de virada — e não de derrota.
Permita-se respirar.
Permita-se reorganizar.
Permita-se renascer.
Porque, às vezes, é só no subsolo que descobrimos quem realmente somos —
e de onde podemos, finalmente, subir com segurança e respeito próprio.
Sobre o Autor – Dr. Jairo de Paula
Jairo de Paula é doutor em Psicanálise, escritor e conferencista internacional, autor de 35 livros — entre eles os best-sellers “Uma Marca Chamada VOCÊ” e “INCLUSÃO – mais do que um desafio escolar, um desafio SOCIAL”. Com mais de 10.000 atendimentos clínicos realizados, alia escuta sensível à experiência acadêmica com doutorado em Psicanálise, além de pesquisador em Gestão do Capital Intelectual e criador de programas inovadores como “FAMÍLIA & ESCOLA”. Pensador inquieto e apaixonado por conhecimento, acredita que a verdadeira transformação nasce do poder da escuta e da escolha diária pela felicidade.